Como funciona o Conselho de Direitos Humanos da ONU?
O que é o Conselho de Direitos Humanos?
O Conselho de Direitos Humanos (CDH) é um órgão intergovernamental dentro do sistema das Nações Unidas, composto por 47 Estados responsáveis pela promoção e proteção de todos os direitos humanos em todo o mundo. Ele possui a incumbência de discutir todas as questões e situações temáticas de direitos humanos que requerem sua atenção ao longo do ano.
De quanto em quanto tempo acontece a sessão?
O CDH realiza pelo menos três sessões ordinárias por ano, por um total de pelo menos dez semanas. Eles ocorrem em março (quatro semanas), junho (três semanas) e setembro (três semanas).
Como são as sessões do Conselho? Quem faz parte (falando e ouvindo)?
As sessões são divididas em agendas, que incluem a discussão de normas de direitos humanos implementadas pelo mundo e votações de resoluções. Relatoras/es também apresentam relatórios temáticos ou produzidos durante visitas aos países que sofrem violações de direitos humanos. Delegações dos países estão presentes, assim como a sociedade civil, que pode se manifestar durante a sessão. Em geral, o espaço é utilizado por organizações para dialogar com as/os Relatores/as e denunciar violações de direitos humanos nos países por meio de declarações orais ou escritas (oral ou written statements).
O que incidência internacional? Para que serve? Como é feita?
Incidência ou advocacy, palavra que deriva do latim “advocare”, que significa ajudar alguém que está em necessidade. A tradução para o português “advogar” pode não se adequar por passar uma conotação jurídica, sendo que o advocacy não se restringe a isso. Trata-se de defender e argumentar em favor de uma causa, influenciando leis, políticas públicas e decisões que atendam ao interesse público. E é isso que diferencia o advocacy do “lobby”, uma vez que este defende apenas interesses privados.
Incidir em mecanismos internacionais, assim como fazer incidência nas esferas municipal, estadual e federal, tem a finalidade de promover causas públicas, como os direitos humanos, auxiliando na construção e implementação de políticas públicas, leis etc.
A forma como é feita o advocacy varia de acordo com o mecanismo em que se está incidindo. Cabe primeiro conhecer sua finalidade e funcionamento, para então compreender de que forma pode-se participar e quais resultados podem ser obtidos a partir desta atuação.
Nesta publicação reunimos todas as incidências realizadas pelo IDDH na 44ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, que acontece entre os dias 30 junho-17 julho de 2020. Nesta conferências, participamos com declarações conujntas orais e escritas (oral and written statements). Confira:
Incidência sobre hanseníase no Brasil
A Relatora Especial sobre a eliminação da discriminação contra as pessoas afetadas pela hanseníase e seus familiares, Alice Cruz, apresentou relatório sobre a visita ao Brasil. Nele, entre outras questões, ela recomenda ao Estado brasileiro uma série de medidas para o enfrentamento das desigualdades sociais e do estigma que afetam as pessoas com hanseníase no país. E demandou, com urgência, a reparação às filhas e filhos que foram separadas/os de suas mães e pais pela política de isolamento compulsório.
Após a apresentação em Diálogo Interativo, a Assessora de Projetos do IDDH, Suiany Zimermann Bail, apresentou uma declaração oral conjunta (joint oral statement) elaborada pelo Morhan, Coletivo RPU Brasil, IDDH, Gestos e o Centro de Educação e Assessoria Popular (CEAP).
Nesta oportunidade, as organizações agradeceram o trabalho da Relatora sobre o Brasil, pontuaram as implicações nos direitos humanos decorrentes das medidas de austeridade econômica em curso no Brasil e reafirmaram a necessidade do cumprimento das recomendações da relatora pelo governo brasileiro, em especial a reparação às filhas e filhos separados de todo o país.
Repercussão:
Hanseníase: ONU pressiona Brasil a reparar indivíduos separados de pais. Veja mais em: https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2020/07/06/hanseniase-onu-pressiona-brasil-a-reparar-individuos-separados-de-pais.htm?cmpid=copiaecola
Incidência sobre a violência contra mulheres jornalistas
A violência contra mulheres jornalistas foi foco do Relatório apresentado pela Relatora Especial das Nações Unidas sobre a Violência contra a Mulher, suas Causas e Consequências, Dubravka Šimonovic, que aborda ferramentas frequentemente usadas para desonrar, desacreditar e humilhar as jornalistas.
A porta-voz da declaração apresentada durante o Diálogo Interativo com a Relatora foi Bianca Santana, jornalista que, em maio, foi acusada pelo Presidente da República de escrever ‘fake news’ na mesma semana em que escreveu um artigo sobre a relação entre familiares e amigos de Bolsonaro com os acusados de assassinar a vereadora Marielle Franco.
O statement aponta que, desde o início do atual governo, as jornalistas foram atacadas pelo Presidente ou seus ministros por, pelo menos, 54 vezes, um número sem precedentes na história recente do país. “O Estado brasileiro tem a obrigação de garantir um ambiente seguro para as mulheres jornalistas”, reforça Bianca. Também é apontada a gravidade de um cenário em que agressões são reafirmadas, legitimadas e praticadas por autoridades públicas, violando obrigações assumidas internacionalmente pelo Estado brasileiro. Os casos, que articulam declarações públicas, ataques virtuais e consequências concretas na vida e na saúde de mulheres comunicadoras, criam um ambiente ainda mais hostil para o exercício da atividade profissional das jornalistas, para a liberdade de imprensa e para a participação de mulheres no espaço público.
O IDDH co-patrocinou (co-sponsored) a declaração oral conjunta (Joint oral-statement) apresentada pela Terra de Direitos e apoiada pelas seguintes organizações: Agência de Notícias Alma Preta, Artigo 19, Casa Neon Cunha, Coalizão Negra por Direitos, Cojira-SP – Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial de São Paulo, Fenaj – Federação Nacional dos Jornalistas, Instituto Marielle Franco, Geledés – Instituto da Mulher Negra, Gênero e Número, Instituto Vladimir Herzog, Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, Marcha das Mulheres Negras de São Paulo, Rede Nacional de Proteção a Comunicadores, Repórteres Sem Fronteiras, Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, SOF – Sempreviva Organização Feminista, Uneafro Brasil.
Repercussão: Ataques do governo Bolsonaro a mulheres jornalistas são denunciados: https://www.uol.com.br/ecoa/colunas/bianca-santana/2020/07/07/ataques-do-governo-bolsonaro-a-mulheres-jornalistas-sao-denunciados-a-onu.htm; Bolsonaro é denunciado na ONU por ataques contra jornalistas: https://veja.abril.com.br/mundo/bolsonaro-e-denunciado-na-onu-por-ataques-contra-jornalistas/
Incidência em Diálogo Interativo com a Relatora Especial sobre Educação
A coordenadora executiva do IDDH, Fernanda Brandão Lapa, fez uma participação (oral statement) no Diálogo Interativo com a Relatora Especial para Educação. Ela recentemente apresentou seu relatório temático especial sobre Covid-19 seu impactos na educação (Impact of the COVID-19 crisis on the right to education; concerns, challenges and opportunities) e prepara agora um relatório sobre a dimesnsão cultural do direito à educação.
A declaração, que recebeu apoio do Conselho Indigenista Missionário – Cimi, Terra de Direitos, Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil e
Campanha Nacional pelo Direito à Educação, “recomenda que a Relatora inclua uma perspectiva intercultural e um diálogo sobre o direito à educação que possibilite o desenvolvimento entre diferentes pessoas, conhecimentos e práticas, um novo significado entre eles em suas diferenças.”
Também salienta que “Todos os Estados devem implementar a 4ª fase da do Programa Mundial de Educação em Direitos Humanos – PMEDH, a fim de incluir neste diálogo todos os diversos grupos culturais de jovens para construir uma educação anti-racista, anti-sexista e anti-discriminatória, que só é possível respeitando a Democracia.”
Incidência conjunta sobre situação dos povos indígenas no Brasil
Em Diálogo Interativo com Obiora Okafor, Expert Independente sobre Solidariedade International, o Conselho Indigenista Missionário apresentou declaração conjunta do próprio CIMI e do Instituto de Desenvolvimento e Direitos Humanos (IDDH).
Apoiada por: Comissão Episcopal Pastoral para a Amazônia, CNBB; Rede Eclesial Pan Amazônica – Brasil; Red Iglesias y Minería; Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB); Movimento Nacional de Direitos Humanos (MDNH); Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil; Rede de Cooperação Amazônica (RCA); Instituto de Pesquisa e Formação Indígena – Iepé.
O discurso apresentado, que pode ser lido na íntegra e também em português, aqui, ressalta o forte engajamento de organizações indígenas e indigenistas em âmbito nacional e internacional. Lembra que “os debates devem centrar-se na proteção dos territórios tradicionais e seus recursos adjacentes. Indígenas não são apenas vítimas das mudanças climáticas, mas também agentes de mudança, de acordo com os ODS. Territórios indígenas aportam uma resiliência climática imprescindível. Os diversos modos indígenas de viver trazem lições importantes ao modelo econômico dominante. Contudo, o governo brasileiro paralisou os processos de demarcação, desmontou a regulação ambiental, e agora, vetou aspectos essenciais do plano emergencial indígena para a COVID-19, como o acesso à água. O Brasil deixa abruptamente o papel de protagonista ambiental para assumir o papel de líder do ceticismo climático.”