O alerta é do Coletivo Revisão Periódica Universal (RPU) Brasil, uma coalizão de entidades da sociedade civil da qual o IDDH é integrante; a carta foi entregue no dia 15 de agosto ao presidente do Senado.
O Coletivo RPU Brasil emitiu um alerta ao Congresso Nacional sobre a sua ação em desacordo com os princípios fundamentais de direitos humanos, ao avançar com o Projeto de Lei (PL) 2903 (antigo PL 490), que impõe o marco temporal de forma legislada. O documento foi entregue ao presidente do Senado Federal, o senador Rodrigo Pacheco, onde o PL encontra-se em análise.
O Coletivo, cujo propósito é monitorar a situação dos direitos humanos no Brasil à luz das Recomendações da Revisão Periódica Universal (RPU), destaca que a tramitação do PL 2903 no Congresso Nacional contradiz uma recomendação aceita pelo Estado brasileiro. Esta recomendação foi proposta pela Noruega durante o 4º Ciclo da Revisão Periódica Universal, ocorrido em novembro de 2022, e exorta o Brasil a concluir os processos de demarcação de terras pendentes, a rejeitar a tese do marco temporal e a assegurar a proteção dos Povos Indígenas contra ameaças, ataques e despejos forçados.
É importante ressaltar que o Brasil aceitou formalmente essa recomendação durante a 52ª sessão ordinária do Conselho de Direitos Humanos (CDH) no primeiro semestre de 2023. O Representante Permanente do Brasil junto às Nações Unidas em Genebra, embaixador Tovar Nunes, fez a declaração de aceitação com base nas instruções do Ministério das Relações Exteriores e do Ministério de Direitos Humanos e Cidadania (MDHC).
“A prova da aceitação deu-se através de relatório produzido pelo Conselho de Direitos Humanos, ao lado dos demais Estados que compuseram a Troika de Revisão do Brasil: Japão, Montenegro e Paraguai”, recorda o Coletivo.
O alerta é motivado pela ação da Senadora Soraya Thronicke, relatora do PL 2903/2023 na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária. A senadora emitiu um parecer favorável à imposição do marco temporal por meio de lei, ignorando a recomendação do CDH e as múltiplas considerações de órgãos internacionais de direitos humanos, bem como dos próprios povos indígenas e suas organizações, juristas e diversos setores da sociedade brasileira que apoiam a causa indígena.
O PL 2903, se aprovado pelo Senado Federal, representará uma séria ameaça aos povos indígenas, expondo-os a conflitos intensos, violência, mortes e genocídio. Isso ocorre porque o projeto privará os povos indígenas do seu direito fundamental às terras tradicionais e, consequentemente, de sua existência, em uma ação conduzida pelo Congresso Nacional.
É vital compreender que as recomendações aceitas por um Estado durante a Revisão Periódica Universal têm caráter jurídico, sendo obrigatórias e geradoras de efeitos jurídicos tanto interna quanto externamente. As obrigações internacionais de um Estado vinculam os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, tornando-os responsáveis por não praticar atos que contrariem essas obrigações.
O Coletivo RPU Brasil reitera que vários órgãos internacionais já indicaram a incompatibilidade da tese do marco temporal com os direitos dos povos indígenas. Além disso, a tese vai de encontro aos princípios fundamentais da Constituição Federal de 1988, que reconhece o direito originário dos povos indígenas sobre suas terras tradicionais. Importantes instâncias, como o Comitê de Direitos Humanos da ONU e a Relatoria da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas, têm apontado a ilegalidade e a inconstitucionalidade dessa abordagem.
Enquanto isso, o Poder Legislativo insiste em violar recomendações da RPU aceitas pelo Estado brasileiro, e segue na incessante violência contra os povos indígenas e no descaso às invasões aos territórios indígenas. Inerte às investidas de poderes econômicos, representados principalmente pela bancada ruralista no Congresso Nacional, que tem trabalhado para reduzir ou suprimir os direitos indígenas, com objetivo de avançar sobre as terras e as riquezas que elas abrigam, por meio de PLs como o 2903.
Em face desse contexto, o Coletivo RPU Brasil insta ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal para que observem rigorosamente as obrigações soberanas assumidas pelo Estado brasileiro por meio da RPU, bem como a ratificação dos tratados internacionais de direitos humanos. Isso inclui atenção às recomendações das diversas instâncias e mecanismos do Sistema ONU e do Sistema Interamericano.
Para mais informações:
Coletivo RPU Brasil /Cimi: +55 61 9641-6256 ou [email protected]
Coletivo RPU Brasil /Apib: +55 75 8884-1009 ou [email protected]
Coletivo RPU Brasil / Justiça Global – Antonio Neto: +55 21 98041-8631